O muito antigo amigo Carlos Rivorêdo,
do seu retiro longínquo, sempre presente às questões sociais,
leu o protótipo de Bonecos e Pretinhas e descascou...
do seu retiro longínquo, sempre presente às questões sociais,
leu o protótipo de Bonecos e Pretinhas e descascou...
.
Guina, vou dizer o que me veio à cabeça com a leitura de seu livro. Não sou crítico literário; visto apenas a pele de leitor atento. Só.
Guina, vou dizer o que me veio à cabeça com a leitura de seu livro. Não sou crítico literário; visto apenas a pele de leitor atento. Só.
Seu escrito me trouxe à mente
inúmeras coisas. A primeira delas foi uma vontade enorme de reconciliação com
minha cidade natal. O Rio de Janeiro tão judiado, emblema do Brasil. Essa
cidade que me viu nascer, crescer, tornar-me o que sou e que, sem saber,
impregnou-me de seu modo de viver ou de (sobre)viver. Hoje, vivo, mesmo que
seja em uma dimensão pequena, a experiência do estrangeiro, estando fora da
vizinhança da Boca Banguela há quarenta anos. Lendo sua produção em letras e
imagens percebi o quanto ficou impregnada a cidade e sua generosidade violenta.
Pensando o Rio e o Brasil,
conforme você me trouxe, senti que há (e sempre haverá) um conflito subliminar,
mas com contornos evidentes no cotidiano. Essa contradição entre uma sociedade
que se organiza em torno de abstrações inquietas e a sempre efervescente
manifestação do real da comunidade. A primeira, na tentativa atemporal de
tornar os homens e mulheres uma massa homogênea e dócil, movida a servidão
imposta por dispositivos de poder que oprimem a todos, seja pelo poder
macropolítico, seja pela circulação dos poderes microcirculantes. A outra, com
seus contornos de procura de identificação entre seus elementos, mutável,
dinâmica, esforçando-se a todo momento para viver o real, aquilo que encontra
no virar uma esquina. Nessa, os sujeitos se encontram, desencontram e se fazem
humanos.
Essa contradição me pareceu presente,
o tempo inteiro no seu livro, tanto nos bonecos quanto nas pretinhas. Aqueles
funcionando como testemunhas e emblemas do real que as pretinhas evidenciam. Os
bonecos dizem dos momentos expressos nas palavras que, a todo momento tentam
dar pistas da concretude da vida. Como tudo é interpretação e discurso, as
palavras expressam e as imagens dizem algo como: “Olha aí, eu não disse?”
Exemplo.
Como não há diálogo entre eles,
bonecos e pretinhas dizem em conjunto o que o leitor encontra na perplexidade
desses nossos tempos tão terríveis. Fica bem claro, para quantos quiserem ver,
o tanto de reflexo na vida dos que pensam e praticam a solidariedade e a
preocupação com a ResPublica, a dura realidade que esse tempo nos impõe.
http://www.libero-arbitrio.it/mitologia/vaso-di-pandora-significato-mito/ |
O vaso de Pandora está aberto. Os
males se exteriorizam diuturnamente trazendo para o real o binômio fascista do
ódio e do medo. Tornam a vida um moto perpétuo de sobreviver a qualquer custo e
a duras penas. Isso, as palavras e as imagens me trouxeram. Os bonecos e sua
transmissão atemporal do real e as pretinhas trazendo o que há de desdobramento
no mesmo real do vaso destampado.
Mas, como nos chama a atenção o
próprio mito, dentro do vaso, escondida, mas presente, virtuosa, sobreviva e
forte, está a tal Esperança. Bela, discreta, insidiosa e poderosa, ela se
instala e toma as formas que o tempo lhe permite, como uma metamorfose que se
transforma segundo a necessidade. Seja no Carnaval parcialmente interditado, na
beleza para outros da reforma urbana, seja nas idas e vindas da satisfação do
desejo de dizer não a uma sociedade perversa e pervertida, seja, enfim, no que
aproxima os homens e as mulheres pela constância do amor e suas inúmeras formas
de existir.
Esse movimento, no seu livro, nas
palavras e nas imagens, está afirmado a todo momento. Claro que os Males estão
soltos, mas é nítida a Esperança que se esgueira sorrateira entre
eles e afirma a Vida como valor maior. Nós, humanos, somos capazes de amar.
Carlos
Rivorêdo é médico
(Faculdade de Ciências Médicas – UERJ e Universidade de Taubaté – UNITAU)
e ex-professor na Universidade
Estadual de Campinas – UNICAMP.
Um comentário:
Por Natalia dos Anjos, no Facebook: "Acabei de ler o texto, fico muito feliz por alguém descrever de maneira tão incrível meu sentimento em relação ao livro. Meu amigo Carlos obrigada por sua competência. Bjs bjs bjs."
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